Esta situação tem contribuído para a sobrelotação dos cemitérios e é um dos vários fatores que tem levado a um gradual aumento de práticas menos convencionais em Portugal – como é o caso dos diamantes de memória –, a par de outros motivos de natureza económica, ambiental e religiosa.


A crise dos cemitérios em Portugal


Na década de 1960, Portugal começou a adotar a prática de enterro temporário, sendo que, ao fim de 3 anos de sepultamento, o cadáver seria transladado para um ossário, libertando a sepultura para o próximo enterro. No concelho de Lisboa, esse período é de 5 anos. Caso o corpo ainda não esteja em condições para ser transladado, é feita uma nova exumação ao fim de 2 anos.

Contudo, em Portugal, são vários os cadáveres que permanecem apenas parcialmente decompostos ao fim de longos anos e existem cada vez mais casos de corpos que apresentam partes do seu corpo mumificadas. Contrariamente ao que seria de esperar, este fenómeno não se consegue explicar pelas características do solo. A investigadora Ângela Silva Bessa recolheu amostras de cadáveres de cinco cemitérios em Portugal, com solos de características distintas, mas que partilham esta particularidade, sendo que a causa poderá estar relacionada com substâncias ingeridas e outros fatores que serão agora analisados.

Para além deste fenómeno ser uma das causas da sobrelotação de cemitérios em Portugal, é também uma situação que pode causar enormes transtornos à família. Sempre que um cadáver é exumado, a família é notificada, pelo que, quando um ente querido é desenterrado por diversas vezes ao longo de anos, isso pode levar a uma maior fragilidade emocional.


O impacto ambiental dos enterros tradicionais


Os enterros tradicionais continuam a ser a prática fúnebre mais comum em Portugal, embora a cremação seja um método cada vez mais requisitado. Contudo, ambas as opções são extremamente prejudiciais para o ambiente, particularmente os sepultamentos convencionais em cemitérios.

Está cientificamente provado que a qualidade dos solos nas proximidades dos cemitérios sofre com a presença dos agentes patogénicos que resultam da decomposição humana. Acresce que os caixões convencionais utilizam frequentemente metais pesados, químicos nocivos e tecidos sintéticos, ou seja, apesar de serem feitos de madeira, não são de forma alguma biodegradáveis. No tocante aos cemitérios, estes são espaços que ocupam bastante espaço – por vezes, dentro da própria malha urbana –, e que também requerem manutenção constante, incluindo o uso de pesticidas e de outros químicos no tratamento das áreas jardinadas.

Acresce que, para além de serem locais pouco amigos do ambiente, os cemitérios em Portugal estão claramente sobrelotados. Para além da questão da demora da decomposição, o aumento populacional e os limites espaciais têm levado a situações muito críticas. É o caso do cemitério da Fuseta, em Olhão, que em Julho de 2021 apenas tinha 10 covais livres ou, mais recentemente, os cemitérios urbanos no concelho de Cascais, sendo o caso mais grave o de S. Domingos de Rana, com 1 350 covais para 46 mil habitantes.


Os portugueses estão a optar pela transição para diamantes, em vez de serem sepultados


Apesar de Portugal ser um país predominantemente católico, a procura por alternativas aos funerais tradicionais continua a aumentar e são cada vez mais aqueles que optam pela cremação. Por norma, após o corpo ser cremado, as cinzas são depositadas numa urna e entregues à família, mas hoje em dia já é possível utilizar cinzas humanas para criar um diamante em laboratório – comumente conhecido como diamante de memória.


Credits: Supplied Image; Author: Client; Transição para um belo diamante de memória após a morte


Os diamantes de memória são tão puros quanto os diamantes naturais, diferindo apenas no que toca ao modo de produção: os diamantes naturais são moléculas de carbono originadas no manto terrestre e que podem levar mais de um bilião de anos a atingir a superfície. Ao longo desse período, as altas pressões a que são submetidas acabam por cristalizá-las, transformando-as em diamantes, que são depois extraídos, polidos e lapidados. Por sua vez, os diamantes de memória são feitos a partir do carbono das cinzas humanas e com recurso a métodos laboratoriais.

Para tal, é enviada uma pequena amostra das cinzas para um laboratório especializado em diamantes de memória. Essa amostra de cinzas é depois purificada em laboratório, para eliminar quaisquer resíduos não-desejados, e submetida ao processo de síntese, que basicamente replica as altas pressões do manto terrestre em ambiente controlado. Este processo permite criar atingir o ponto de cristalização num período que varia entre 3 e 9 meses. Assim são criados os diamantes de memória. Após esta etapa, o diamante de memória é polido e lapidado, conforme os requisitos do cliente, sendo que a maioria dos laboratórios disponibiliza os respetivos certificados de autenticidade.

Embora este método seja relativamente recente em Portugal, os diamantes de memória são cada vez mais populares, particularmente tendo em conta a crise de sobrelotação de cemitérios em Portugal, bem como as despesas relativas a funerais tradicionais – que custam em média 5 090€. Por sua vez, o custo de um diamante de memória em Portugal com 0,25 quilates é de 1 900€ e o resultado é uma peça única e que pode ser usada no dia-a-dia, para que mantenha sempre aqueles que já partiram junto de si.


Os diamantes de memória também podem ser obtidos a partir de amostras de cabelo, devido à presença do carbono. Apesar de se tratar de um método muito utilizado para homenagear os entes queridos já falecidos, existem alguns pedidos para criar diamantes de memória com amostras de cabelo de familiares ou amigos que ainda estão entre nós, mas que por motivos de distância ou saudade são assim lembrados.


Apesar da forte influência católica nas práticas fúnebres em Portugal, a sobrelotação dos cemitérios e os riscos ambientais gerados pelos enterros tradicionais têm levado a outras alternativas, como a cremação. Ainda assim, com a tecnologia atual, é possível criar diamantes de memória a partir de cinzas humanas e lembrar os nossos falecidos de uma forma verdadeiramente única, transformando-os em tesouros que podem ser usados todos os dias.