O artigo científico, publicado na revista científica "Papers In Paleontology", descreve a descoberta da nova espécie "Cambelodon torreensis", um mamífero do Jurássico Superior português que os investigadores acreditam que poderá ter andado na Terra há cerca de 100 milhões de anos.
A descoberta, que trouxe informações "sobre a evolução dos mamíferos primitivos, bem como a sua dieta e mecânica de mastigação", foi estudada por investigadores portugueses, brasileiros e belgas, num trabalho desenvolvido sobretudo por Víctor Carvalho durante a sua dissertação de mestrado em Paleontologia na NOVA FCT.
Em declarações à agência Lusa, o orientador da investigação, Bruno Camilo, disse tratar-se de "uma descoberta muito rara", tanto pela sua localização, quase numa espécie de armadilha natural", como pela quantidade de "ossos", incluindo dentes e a mandíbula de um mamífero da Ordem Multituberculata, um grupo extinto.
Descoberta em Cambelas, no concelho de Torres Vedras, no distrito de Lisboa, a nova espécie, denominada "Cambelodon torreensis", pertencia ao grupo de mamíferos que teria conseguido sobreviver em terra devido a algumas particularidades como "dentes bizarros".
"Eram animais muito pequenos, do tamanho de um esquilo, quadrúpedes", descreveu Bruno Camilo, acrescentando que a sua dentição "parece sugerir que eram omnívoros, com uma dieta generalista".
"Não há hoje nada vagamente semelhante a eles", diz Ricardo Araújo, num comunicado em que sublinha que "a descoberta do Cambelodon oferece dados absolutamente novos sobre a origem deste grupo".
O fóssil encontrado em Cambelas foi analisado por nanotomografia no Instituto Superior Técnico, tendo sido "possível identificar que se tratava de um indivíduo jovem, ainda com os dentes de leite preservados".
Uma descoberta rara que permitiu "distinguir o padrão de substituição dentária desta espécie, ou seja, a ordem pela qual os dentes são substituídos", explicou Víctor Carvalho, autor principal do artigo.
"Entre os mamíferos modernos e multituberculados, a substituição dos dentes é feita predominantemente da frente para trás (primeiro os incisivos, depois os caninos, os pré-molares e, por fim, os molares). O Cambelodon apresenta uma substituição dentária inversa, ou seja, de trás para a frente e de forma não sequencial".
Esta substituição é extremamente rara: só se conhecem mais dois exemplares de multituberculados em todo o mundo, uma espécie encontrada na China e outra em Portugal, na mina de Guimarota, como se lê no texto.
O Cambelodon foi classificado como membro da família Pinheirodontidae, um grupo de multituberculados criado há quase 30 anos com base em fósseis encontrados em Portugal.
Desde então, foram também identificados representantes desta família em Espanha, Alemanha e Inglaterra, mas todos são conhecidos apenas por dentes isolados.
O fóssil foi descoberto em 2022, numa zona "onde existem pelo menos três pequenos dinossauros", disse Bruno Camilo, acrescentando que o bloco completo, que faz parte da coleção da Sociedade de História Natural(SHN) de Torres Vedras, está a ser estudado, devendo os fósseis ser expostos no centro de investigação paleontológica, em Santa Cruz, Torres Vedras.