Este ano, as estimativas dos agentes do sector indicam que serão concluídas 28 000 novas habitações em todo o país.

"Há vinte anos, eram construídas 100.000 casas por ano. Hoje, constroem-se em média 24.000 a 25.000 casas novas, com um pico de 28.000 este ano. Os preços só vão baixar com mais oferta, mas não há capacidade para fazer mais", afirmou Manuel Maria Gonçalves, presidente da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários(APPII), durante uma conferência sobre o pacote de medidas do Governo para a habitação organizada pelo Diário Imobiliário.

A falta de mão de obra, estimada em 80 mil a 100 mil trabalhadores, a tributação "excessiva" das empresas de construção e dos clientes, que pode representar até 40% do custo total dos projectos, a lentidão dos licenciamentos e a aplicação de medidas isoladas de estímulo durante toda a legislatura são os principais factores que agravam a crise da habitação.

"Ambicioso"

Para a maioria dos oradores, as medidas anunciadas pelo Governo em setembro são "ambiciosas" mas "dificilmente exequíveis". A redução para 6% da taxa de IVA, há muito reivindicada pelo sector, é "bem-vinda", mas, como salientou João Sousa, CEO do Grupo JPS, "poderá ter impacto apenas nos novos projectos de construção que serão lançados dentro de um ano e meio ou dois anos".

Além disso, esta e outras medidas de incentivo à oferta de habitação "estão limitadas pelo ciclo político", criando uma enorme instabilidade para os investidores, acrescentou o mesmo promotor. "É uma medida arrojada, mas que deveria prolongar-se para além de 2030", concluiu.

Madalena Azeredo Perdigão, sócia da CCA Law Firm, referiu que a nova taxa reduzida de IVA, para casas avaliadas em menos de 648 mil euros, ainda precisa de ser autorizada pela Comissão Europeia, depois de aprovada pelo Parlamento Europeu, o que poderá atrasar ainda mais a sua entrada em vigor.

O novo pacote do Governo "não tem as medidas de choque que precisamos porque não é imediatamente implementável", disse José Rui Menezes e Castro, CEO do Grupo MAP. "Uma política de choque criaria condições para disponibilizar no mercado o parque habitacional existente", acrescentou.

O anúncio do Governo de que vai construir milhares de novas casas com recursos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e do Banco Europeu de Investimento(BEI) foi questionado pelos promotores imobiliários.

"Os números estão crescendo a cada dia para ter um impacto, mas não há capacidade para construir o que foi anunciado. Cada câmara municipal trabalha com o PRR como se fosse uma microempresa. Não há uma estrutura global que encaixe tudo a nível central", disse João Souza.

Sem capacidade

O arquiteto Nuno Malheiro diz que nem os municípios nem o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana(IHRU) têm capacidade para aproveitar os fundos disponíveis, nomeadamente os do PRR (Programa de Reformas), que termina em 2026.

Relativamente à simplificação do licenciamento, também anunciada pelo Governo, os oradores ilustraram a sua experiência com as câmaras municipais com exemplos concretos, sublinhando que não basta reduzir os tempos de resposta.

"A mesma lei é interpretada de forma diferente pelas câmaras municipais, já para não falar dos regulamentos, que têm regras próprias. Isto dificulta as coisas e cria incerteza", afirmou Nuno Malheiro, que considera que "simplificar é uniformizar as regras" em todos os municípios.

O pacote habitacional do Governo, anunciado em setembro como uma "política de choque" para "agitar o mercado da construção e do arrendamento" no país, inclui a redução do IVA na construção para 6% nas vendas até 648 mil euros e nas rendas até 2.300 euros, deduções fiscais nas rendas até 900 euros, redução da taxa de IRS de 25% para 10% nas rendas "moderadas" até 2.300 euros, simplificação do licenciamento e aumento do IMT (Imposto Municipal sobre Imóveis) para não residentes.