Existem países em que vivemos e países que nos prendem. Portugal se tornou o último para mim. Chegei aqui depois de doze anos no sudeste da Ásia com oito malas, o início de uma história que percorreu continentes e uma sensação tranquila de que estava entrando em um novo capítulo da minha vida. O que eu ainda não sabia era o quão profundamente esse país moldaria a forma final dessa

história.

As primeiras páginas de The Red Silk Dress foram redigidas na Ilha de Penang, Malásia, no silêncio antes do nascer do sol, na minha sala de redação com vista para o Estreito de Malaca e em pequenos cadernos durante longas tardes de monção. Eu o levei comigo pelos templos de Siem Reap e pelas ruas movimentadas de Phnom Penh. Esses lugares me marcaram de uma forma que ainda tenho dificuldade em descrever. Paris também aparece no romance, embora a Paris que escrevi seja imaginada e não vivida, assim como as cidades que se tornam espelhos de saudade em vez de

memória.

Mas foi em Portugal que me tornei seu autor. A edição aconteceu aqui, não em explosões dramáticas, mas no ritmo moderado e agradável que este país parece incentivar. Isso me fez pensar em quantos de nós carregamos histórias inacabadas, esperando o lugar certo ou o ritmo certo para permitir que elas sejam concluídas

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Há algo na atmosfera aqui que convida à reflexão sem urgência. Talvez seja a qualidade da luz ou a forma como o Atlântico se abre como uma frase inacabada. Talvez seja o ritmo da vida cotidiana, a expectativa moderada, a forma como as pessoas permanecem sem desculpas. Seja qual for o motivo, Portugal me deu espaço para retornar ao meu manuscrito com um tipo diferente de atenção. Mais suave. Mais estável. Mais honesto.

Morar aqui me fez pensar de forma diferente sobre como o lugar nos molda. No sudeste da Ásia, a vida se desenrolava em cores e intensidade vivas; tudo parecia imediato, intenso, próximo à pele. Portugal, ao contrário, convidava a uma sintonia mais sutil — o tipo de percepção que acontece quando você para de correr em direção a um futuro imaginado em outro lugar. Isso me encorajou a prestar atenção aos gestos da vida diária, às pausas entre as coisas, à beleza discreta que só se revela quando você está disposto a

ficar quieto.

Percebi, lentamente, que um romance não é escrito apenas por meio dos improváveis companheiros de criatividade e disciplina, mas por meio do lugar. Alguns lugares nos convidam a expandir; outros nos ajudam a ouvir. Portugal fez o último. Ele ofereceu um recipiente para o trabalho mais silencioso de moldar uma narrativa, de encontrar a clareza emocional necessária para terminar algo que começou longe dessas margens

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E nesse processo, outra coisa mudou. Comecei a me ver menos como visitante e mais como escritora conversando com um país que estava me ensinando a viver minha própria vida criativa. Encontrei espaços favoritos, os tipos de recantos onde as ideias se reúnem. Transportei minha sala de escrita asiática - a chaise longue de veludo vermelho macio, a escrivaninha indiana parsi - e até pintei a parede atrás da minha mesa em azul peranakan malaio. Agora, no último andar da minha nova casa, a poucos passos da beira do rio Tejo, sentei-me, novamente, de madrugada, polindo e moldando cada palavra e verbo até que uma sensação silenciosa de satisfação se instalou em minha alma. Aprendi a confiar no lento desenrolar das coisas

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Tornar-se romancista em Portugal não foi uma transformação dramática. Foi um acordo gradual. Um aprofundamento. Um reconhecimento de que a criatividade precisa de um tipo específico de solo e que este país - com suas paredes de azulejos, suas chuvas de inverno, sua mistura fácil de melancolia

e beleza - ofereceu exatamente isso.

Enquanto me preparo para trazer meu livro ao mundo, Portugal continua presente de maneiras que me surpreendem. Não na história em si, mas na forma como passei a entender o ato de escrever: como algo enraizado no lugar, moldado pela atenção e fortalecido pela coragem silenciosa de continuar com uma história até que ela revele o que ela precisa dizer. E talvez seja por isso que Portugal parecia o lugar certo para terminar o livro. Ele carrega uma compreensão natural do desejo, o que os portugueses chamam de saudade - o espaço agridoce entre o que foi e o que ainda

pode se tornar.

Esta coluna seguirá esse tópico: a interação entre criatividade, pertencimento e os lugares que moldam quem nos tornamos. Nos próximos meses, explorarei os espaços culturais, os saguões de hotéis, os cafés históricos e as livrarias antigas que acompanharam minha vida de escritor, as conversas e os encontros que a aprofundaram e as verdades mais silenciosas que surgem quando prestamos atenção a onde estamos. Com isso, oferecerei um vislumbre falado da história. No final de cada coluna, incluirei uma breve leitura do romance, gravada em um lugar que moldou ou está moldando minha vida como romancista estreante. Este mês, começo com o parágrafo de abertura.

Por enquanto, isso não parece apenas o começo de um novo ano, mas também o começo de um novo capítulo - uma conversa entre uma escritora e um país que a ajudou a ouvir com mais atenção. E, ao compartilhar, espero que isso também ajude você a perceber os lugares que moldaram sua própria jornada.

www.theredsilkdress.com


Biografia:

Natalie Turner é uma autora britânica que vive em Lisboa. Seu romance de estreia, The Red Silk Dress, explora identidade e saudade. Ela também trabalha internacionalmente como consultora de liderança e fundadora da Women Who Lead.